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TEMA: AUTARQUIAS LOCAIS

Hoje, de olhos nos olhos consigo, permito-me a uma reflexão sobre o modelo de organização do Estado com especial atenção para o papel das autarquias locais e qual os desafios que se nos colocam num quadro de grande exigência futura.

A pandemia – que continuamos a enfrentar – veio demonstrar com grande evidência que o Estado tem e deve continuar a ter um papel determinante na defesa dos cidadãos e na geração de condições para que em situações adversas e de grande dimensão, os cidadãos contam com as instituições públicas para uma resposta direta e concreta aos seus problemas.

Vimos isso de forma direta no Serviço Nacional de Saúde, que respondeu com efetividade às necessidades de saúde pública, mas também nas políticas económicas, financeiras, do trabalho, da segurança social e em diversos outros níveis que, por óbvia necessidade encontraram respostas para os problemas dos cidadãos, das empresas e das organizações.

Não obstante estas respostas, centradas na formulação de políticas que promovem a dignidade das pessoas e a manutenção dos rendimentos, as respostas a problemas diários, muitas das vezes práticos, foram desenvolvidas e aplicadas pelas autarquias locais.

Estamos certamente recordados da instalação de hospitais de campanha, de redes de testagem ou, com uma dimensão mais relevante no nosso concelho, de estratégias de controlo do risco de contágio. Essas foram as notícias que todos vimos e escutámos nos meios de comunicação nacional e mediaticamente mais acompanhadas.

Porém a Junta de Freguesia de Moscavide e Portela lançou um programa de apoio às pessoas que, desde a primeira hora, situou a sua linha de atuação nas carências dos cidadãos e na forma como a Junta poderia desempenhar um papel direto no controlo da pandemia e impedir o risco de contágio. A estratégia passou por impedir que as pessoas ficassem doentes, mas ainda assim tivessem acesso a todos os bens ou serviços de que necessitassem. Fomos a casa das pessoas, estivemos onde era preciso.

Esta estratégia, na maioria das medidas pioneira, porque fomos os primeiros, evitou que apesar da densidade habitacional e da existência de muitos cidadãos de risco, o nível de contágio nos colocasse ao nível de outras freguesias que, infelizmente, viveram uma situação mais complicada.

Este plano gigantesco de resposta teve os seus bons resultados na capacidade de olhar o problema e atuar sobre ele de forma determinada, resoluta e assertiva.

Este quadro leva-nos ao outro lado da análise e da reflexão que vos proponho.

Toda a intervenção que a Junta de Freguesia de Moscavide e Portela levou a efeito não contou com nenhum apoio financeiro para as mais variadas medidas de proteção e apoio à população. A Junta assumiu todos os custos sem contar com qualquer meio da Administração Central ou da Câmara Municipal. Todos os recursos envolvidos nesta gigantesca operação que desenvolvemos, foram e são da Junta de Freguesia de Moscavide e Portela. Sim, porque continuamos com a maioria das medidas implementadas.

É conhecida a dificuldade da Junta em termos financeiros, situação que estando agora melhor, resultou de erros no passado, porém e apesar do rigor orçamental que nos impusemos desde a primeira hora, a Junta de Freguesia luta ainda com desequilíbrios que reduzem a capacidade de executar tudo o que queríamos e gostaríamos e, mais importante, tudo o que sabemos ser necessário.

Se ao nível das despesas é claro que as mesmas aumentaram de forma exponencial durante este período, também ao nível das receitas tivemos uma quebra brutal derivado ao confinamento e à limitação económica que a redução de atividade implicou.

Também é hoje reconhecido que para além das carências de recursos nas autarquias locais, com especial dimensão nas Juntas de Freguesia, o quadro regulamentar ao nível da gestão financeira é desajustado, não permite a autonomia dos decisores e, em muitas circunstâncias, traduz-se num obstáculo às respostas necessárias.

O confronto entre a necessidade de resposta rápida, forte e adequada e o labirinto técnico-legal da gestão de uma Junta de Freguesia, é incapacitante, limitativo e potencialmente gerador de cenários de ausência de resposta que importa avaliar e traduzir em alterações legislativas.

Por outro lado a falta de solidariedade entre órgãos da administração local, inibem que a resposta seja mais efetiva, articulada e capaz. A gestão dos recursos faz-se a partir de uma ideia centralizadora em que as Juntas de Freguesia se transformam em meras sucursais das Câmaras Municipais, delas dependendo para a sua resposta em concreto. O que é efetivamente inaceitável.

Sabemos que as Juntas de Freguesia são em muitos casos a primeira porta a que as pessoas em dificuldades vão bater. Na maioria dos casos são a única porta aberta. Em situações de aflição, as Juntas de Freguesia respondem melhor, mais rápido e vão em busca de soluções. As Juntas de Freguesia são, na esmagadora maioria dos casos, o organismo que representa a administração central e local, porém continua a ser vista pelos nossos governantes, como o parente pobre da administração pública.

A Pandemia e a crise social e sanitária vieram reforçar a necessidade de se repensar o papel das Juntas de Freguesia e, porque não das Câmaras Municipais. Ficou demonstrado o papel essencial das autarquias locais, a sua capacidade de organização e a sua proximidade aos cidadãos, mas também demonstrou que os meios, os recursos e a forma de organização não permitem uma solidez de respostas e retira capacidade de estar ao lado das pessoas.

Naturalmente que a crise económica que já se sente e que certamente se seguirá, levantará novos desafios às Juntas de Freguesia. A carência de bens de primeira necessidade, a perda de rendimentos e o desemprego, farão aumentar os pedidos junto das autarquias locais e, conscientes dessa realidade, deveremos desde já iniciar o processo que tenda a mitigar esses impactos negativos.

A Junta de Freguesia de Moscavide e Portela estará onde sempre esteve; ao lado das pessoas, especialmente das mais frágeis. Porém não podemos deixar de frisar que a boa vontade não paga contas e a proximidade não é um recurso que possamos usar para fazer chegar os meios a quem deles necessita. É preciso mais. É preciso que as Juntas de freguesia não continuem a ser o parente pobre da administração pública e sejam munidas dos instrumentos necessários para a sua importante missão. Não podemos continuar a estar dependentes da boa vontade política das Câmaras Municipais ou de respostas que tardam ou são inexistentes.

Por último, mas não menos importante, será de olhar para o plano de recuperação económica e para os recursos que chegarão da União Europeia como uma oportunidade fantástica para se repensar também o modelo de organização do Estado. Se é fundamental que o Estado se torne mais eficaz e eficiente, é também fundamental que os recursos sejam utilizados de forma racional por quem melhor conhece o terreno e por quem está mais próximo dos cidadãos.

O Municipalismo e mais especificamente a dotação da Juntas de Freguesia de um quadro financeiro mais efetivo e de uma capacidade melhorada de intervenção na comunidade, será uma forma de multiplicação dos recursos, da eliminação de burocracias e de maior participação dos cidadãos no seu processo de decisão.

Dar maior poder às Juntas sem prejuízo da capacidade de escrutínio e com uma moldura regulamentar que associe a liberdade à responsabilidade efetiva dos decisores, é um caminho que temos de fazer, aprofundando a democracia representativa, aproximando os recursos das pessoas e a decisão dos cidadãos.

Não há abordagem que torne esta pandemia e a crise sanitária num acontecimento positivo. Não há forma de ver algo bom em algo que é profundamente mau e que alterou de forma total a nossa forma de vida, porém temos sempre de ver nesta circunstância uma oportunidade para ver os erros e melhorar, perceber as fragilidades e evoluir e, a partir daí, construir uma sociedade que esteja mais preparada para o futuro.

Se a intervenção da Junta de Freguesia de Moscavide e Portela foi um “êxito”, fica a dever-se a termos agido cedo, não termos medo de fazer aquilo que achámos certo e de termos a ambição de ser uma parte da solução.

Com a preocupação de ver nas pessoas a nossa mais importante responsabilidade, temos a obrigação de continuamente evoluir e crescer.

De olhos nos olhos digo: Espero que os nossos governantes passem efetivamente a pensar nas PESSOAS! Se isso acontecer, as Juntas de Freguesia deixarão de ser o parente pobre da administração pública.

Ricardo Lima

Vamos Juntos. Primeiro as Pessoas!